Fernando Pinto Ribeiro – 1928/2009
MESTRE DA PALAVRA
“Cantai comigo, cantai
Alegrai o coração:
O que morreu já lá vai
E a tristeza não dá pão!”
Fernando Pinto Ribeiro,
In: “lavra…Boletim de Poesia”,
n.º 9 – Jan/2003
Passavam poucos minutos das 20 horas de Sexta-Feira, 20 de Fevereiro de 2009, e como habitualmente acontece, o jantar era acompanhado das notícias da RTP 1, quando ainda nas primeiras garfadas, toda a família me perguntou em uníssono: “O que foi? O que é que se passa?” – é que eu não me contendo, pousei os talheres e deixei sair do fundo de mim um, bem à moda do Porto, “Porra! Não!”, assim que começaram a passar em rodapé a notícia: “ MORREU O POETA FERNANDO PINTO RIBEIRO, 80 ANOS.”
A mensagem que eu não queria estar a ler, passava insistentemente em frente dos meus olhos. Ironia da vida, logo no dia em que estava reunido, para em família festejar os meus 58 anos, é que tinha de receber a notícia da morte de um Amigo, colaborador e Mestre, desde 2001, altura em que se começou a publicar o “lavra…Boletim de Poesia”, colaboração essa, de que falaremos mais adiante.
Breve Historial
Fernando Pinto Ribeiro, nasceu em 1928, na Guarda. É ainda muito novo quando começa a rimar as palavras, escrevendo quadras soltas, com 14 anos escreve o seu primeiro soneto que intitula de “Soneto dos 15 Anos”.
Radica-se em Lisboa aos 17 anos, onde após ter completado o Curso Liceal, se inscreve na Faculdade de Direito, cujo curso não chegou a completar.
Colaborou nas revistas “Flama”; “Panorama”; “Páginas Literárias”; “Das Artes, das Letras”, suplemento literário do “Primeiro de Janeiro”; “Palavra em Mutação”; “lavra…Boletim de Poesia” e em jornais, como “Diário de Notícias”; “Diário Ilustrado”; “Poetas & Trovadores” e em diversos jornais regionais, tendo também sido publicados no Brasil alguns poemas de sua autoria.
Foi Director da Revista de Letras e Artes “Contravento” (1968), da qual só se conseguiram editar quatro números, pois devido ao seu cariz intelectual e acentuadamente democrático, era um “estorvo” para o poder de então, que era alvo constante da mordaça da censura.
Organizou com Alba de Castro, entre 1967 e 1983, as Pastinhas de Poesia, publicadas anualmente na Queima das Fitas da Universidade de Coimbra.
Participou em múltiplas colectâneas e organizou algumas, como as da Tertúlia Rio de Prata, em Lisboa, da qual era membro fundador.
Pertenceu aos corpos sociais da Sociedade da Língua Portuguesa, era sócio da Associação Portuguesa de Escritores, cooperador da Sociedade Portuguesa de Autores, sócio da Colectividade Grupo Dramático e Escolar “Os Combatentes”. (Colectividade Popular Centenária).
Poeta do Fado
“Vou ser do fado e da farra
Já que o destino assim quis
Tocar viola e guitarra,
Pôr a cantar o País!”
Fernando Pinto Ribeiro,
In: “lavra…Boletim de Poesia”,
n.º 9 – Jan/2003
Frequenta algumas noites de Fado e fica fascinado com o ambiente da noite fadista, começando sem que se aperceba, a identificar-se com a “expressão fadista” o que apela à sua alma de poeta, começando (inicialmente sob o pseudónimo de ”Sérgio Valentino”), a escrever letras/poemas para fados que desde logo foram bastante elogiados. Diversos Compositores de Fado colaboraram com Fernando Pinto Ribeiro, e a qualidade dos seus poemas é tal, que logo houve nomes do panorama musical do Fado que os quiseram interpretar, entre os quais se incluem fadistas como: Ada de Castro; Alexandra Cruz; Anita Guerreiro; António Mourão; António Laborinho; António Passão; António Severino; Arlindo de Carvalho; Artur Garcia; Beatriz da Conceição; Branco de Oliveira; Carlota Fortes; Chico Pessoa; Estela Alves (tia e sobrinha); Fernando Forte; Francisco Martinho; Humberto de Castro; Julieta Reis e sua filha Sara Reis; Lenita Gentil; Lídia Ribeiro; Maria Jô-Jô; Pedro Lisboa; Lurdes Andrade; Natércia Maria; Simone de Oliveira; Toni de Almeida; Tonicha; Tristão da Silva; Xico Madureira, Salete Tavares; Pedro Moutinho; Raquel Tavares; Vanessa Alves; Gina Esteves; Pedro Jordão e Vítor Duarte (Marceneiro III).
Algumas das suas letras para fado, são, entre as mais conhecidas:“Às Meninas dos Meus Olhos”; “A Cantiga dos Pardais”; “Era um Marinheiro”; “Fado Alegre”; “Hino à Vida”; “Nas Ruas da Noite”; “Bom Fim de Semana”; “Noites Perdidas”; “Pensando em Ti”; “Lisboa vai” e muitas mais.
Entre os que musicaram os seus poemas encontram-se os seguintes compositores: - António Carvalho; António Melo; Branco de Oliveira; Helena Moreira Viana; Jaime Santos; Jorge Fontes; Mariel de Sousa; Pedro Jordão e Valdemar Silva.
Mestre da Palavra
“ A poesia é para mim um acto natural, pelo que sou imediatamente compensado pelo simples acto de escrever poemas e de os rever continuamente. Vejo aliás na revisão permanente dos meus poemas uma espécie de volúpia, uma busca incessante pela perfeição, mas ciente de que nunca a atingirei.” – referia Fernando Pinto Ribeiro, em entrevista a P. Leitão Baptista, ao blog “Capeia Arraiana”, adiantando, «Confesso que nunca publiquei porque nunca vi nisso uma necessidade ou mesmo qualquer interesse»
Na sua arte poética, procurava encontrar a perfeição, tentando que cada poema tivesse uma quadratura musicável, com rima e métrica. O que fez com que os seus poemas tivessem sido musicados e cantados.
Homem de profundo saber e de grande afectividade, Fernando Pinto Ribeiro, prezava muito a amizade.
Este blog, pretende para além de prestar um singelo mas mais que merecido Tributo ao Homem e Poeta a quem não foi feita justiça.
Fernando Pinto Ribeiro, o Homem humilde e Poeta solitário, que nunca quis a ribalta e por isso nunca chegou a ver reconhecido o seu imenso valor.
Dele fica-nos a obra que iremos tentar divulgar aqui e noutros espaços, para que não caia no esquecimento e que sirva de exemplo do Poeta perfeccionista, que ao fazer Poesia com amor, merece que o chamem:
- O MESTRE DA PALAVRA!
“… quando se vive e se morre
para cumprir o dever
sem medo
e sem alarde
- para morrer não é cedo
para viver não é tarde.”
Fernando Pinto Ribeiro,
Excerto de “Encontro Fora de Tempo”
In: “à luz do abismo” – Suplemento
“diversos” n.º 4 / “lavra…Boletim de Poesia”,
n.º 12 – Outubro/2003
- Um poema de Fernando Pinto Ribeiro:
SALMO
a João Bigotte Chorão.
Estou morto.
Mas a vida
lambe a minha pele em labaredas.
Sou noite.
Mas o dia
põe-me nos lábios papoilas
e coroa-me de espigas o cabelo.
Ceguei.
Mas a luz
vem poisar-me sobre as pálpebras
outras tantas borboletas inquietas.
Não oiço.
Mas o eco do silêncio
canta o hino imenso que eu não posso.
Não respiro.
Mas aspiro o alento
da maresia no vento.
Não sinto.
Mas pressinto: a minha alma arde
e uma chaga floriu na minha carne.
Não choro.
Mas tremem estrelas cadentes
nas lágrimas pendentes que sustenho.
Não canto.
Mas sopro nuvens
no pó que levanto.
Não ando.
Mas todo o meu espírito
vadia sem folga nem descanso.
Não durmo.
Hiberno: verme esvurmo limo e lama
no fosso em que me enfurno
aninho e faço a cama.
Não amo.
Sobre a seta quebrada no meu peito
raiva uma fonte de sangue
a incendiar a sede a incinerar a fome
dos homens dos bichos das florestas.
Não sonho.
Mas a fé
faz da esperança e da saudade
sentinelas do sepulcro
onde vivo o meu coração jaz
pisado por cavalos em tumulto.
Estou morto.
Mas o sol explode
a luz esplende
em plena primavera
neste corpo
que me prende
e me suspende
absorto.
Fernando Pinto Ribeiro
Texto elaborado por eduardo roseira/lavra...Boletim de Poesia